domingo, fevereiro 27, 2005

Do Sensações de Sofia

Homens: adorem-nos!

14/10/2003

Por Ana Kessler

Estava cá pensando na minha solteirice, na solteirice das minha amigas, e na solteirice das amigas das amigas delas. Comparei com a reclamação de um amigo, que desabafou estar faltando mulher no mercado, reivindicação essa mui em voga entre nós, superpopulação excedente de exemplares femininos do planeta Terra, que afirmamos o contrário. Fiquei tentando equacionar o problema. Estamos todos falando a mesma língua, e usando a língua que é bom, necas. Na minha opinião, a confusão é metodológica: comunicamo-nos na linguagem dos sinais, mas o que precisamos é aprender Braile: os homens estão cegos!

Se eu fosse homem, teria várias mulheres aos meus pés. Ou melhor, teria várias mulheres às quais eu me colocaria aos pés delas. No fundo, é a mesma coisa, por mais que essa tática pareça desmerecê-lo ou transformá-lo num capacho. Nada disso. Você não deve deixar-se pisar, não faz bem ao seu ego, nem ao adestramento dela. A moçoila pode se tornar mimada e exigente, e você não quer uma criança, quer uma mulher com "M" maiúsculo. Colocá-la no pedestal significa venerá-la, tratá-la com respeito, carinho e atenção, fazê-la sentir-se desejada, única, exatamente como você mesmo quer ser tratado. E uma mulher realizada, plena de si mesma, sabe entregar-se como ninguém. Contribuam para o fim da solidão, homens: adorem-nos!

Podem me chamar de machista, mas não vem muito ao caso se ele tem uma ou mais mulheres. Desde que o mundo é mundo o sexo feminino constrói cercas por sobre as quais os homens pulam. Não estamos muito interessadas nas outras, se existem, guardem para si. Como diz uma amiga minha, omita sempre, minta se necessário. O que buscamos num homem é segurança, é a garantia de que, aconteça o que acontecer, podemos contar com ele, tê-lo ao nosso lado. Se o rapaz conseguir incutir esse sentimento em mais de uma pessoa, ótimo pra ele. Confiar nada mais é do que não desconfiar. Óbvio? Obrigatório. Agora, se fizer, faça bem feito. E isso vale para ambas as partes.

Veja bem, não estou estimulando a traição nem dizendo que é legal. Mas também discordo da entrega total e absoluta a uma única pessoa, a anulação em prol do outro, o chamado amor incondicional. Mães sentem isso, e são as únicas não censuráveis, afinal, filhos são sangue do sangue, carne da carne. Agora, entre casais, é bonito, eu sei, mas há que se resguardar, deixar um pedacinho de você nem que seja para você mesma. Como se fosse um botão de emergência para a hipótese do parceiro vir a faltar, seja por opção ou acidente. O mais saudável dos amores é o amor-próprio, mesmo quando compartilhado. Essa coisa de dois seres formarem um só é bacana, mas me agrada mais a idéia de, um mais um, formarem dois.

Concordo, não há fórmula para o sucesso em relacionamentos ou em uma conquista. Se existisse, eu não estaria aqui monologando. Mas há um segredo que vocês, homens, precisam saber: não existe mulher moderna, existe mulher carente. Vendemos uma imagem de super poderosas, mas lá no fundinho desejamos colo e cafuné. Aos olhos de vocês, devemos parecer mais auto-suficientes do que bateria solar. Infelizmente, essa não é a verdade, temos lá nossos dias de chuva. Sim, trabalhamos fora, dividimos as contas, viajamos sozinhas, cozinhamos, usamos camisinha, dirigimos carros e empresas, caminhões, até. Jogamos futebol, lutamos boxe, saltamos de asa delta, viramos astronautas, nos concederam esses e vários outros direitos, e os que nos negaram, brigamos e conquistamos na marra. Mas continuamos fêmeas, com um par de "xis" nos nossos genes, e nem todo o esforço do mundo vai nos transformar no que não somos: completas.

A feminilidade é a nossa arma, senão a única, talvez a última. Na busca pela igualdade, não podemos renegar nosso diferencial, nossa delicadeza, nossa sensibilidade, o poder de intuir, o dom de transformar, a capacidade de gerar vida, de saber esperar. Nem devemos menosprezar o valor do homem, sua virilidade, impetuosidade, o potencial de construir, de lutar pelo que acredita, de defender suas idéias, seu território, sua família, e a qualidade de ser objetivo. Você também pode ser objetiva, ele também pode ser sensível. Podemos e devemos dividir tarefas e qualidades. Só não precisamos provar a nossa força marretando minério numa pedreira.

É muito simples, rapazes: nós mulheres não queremos respostas, queremos apenas que vocês nos escutem. Não desejamos um cão de guarda, e sim um companheiro. Não precisa ir junto ao shopping, mas também não necessita marcar aquele futebolzinho no único dia livre que ela tem para ficar com você. Um gosta de montanha, o outro de praia? Negociem. Façam coisas juntos, façam concessões, façam um ao outro felizes. Jamais elevem a voz, jamais elevem a mão. Respeito é acima de tudo um ato de preservação, não fazer a outrem o que você não gostaria que lhe fizessem. Espaços tanto quanto individualidades devem ser estimulados, união não tem nada a ver com grude. Seja menos crítico: a seletividade excessiva provoca a extinção da espécie. Aqui vai o meu penúltimo conselho: case-se com os defeitos, o que vier de qualidade é brinde. E aprenda a linguagem dos sinais.

OBS: "Sensações de Sofia" é um livro online que conta a história de Sofia do Rio, uma gaúcha que se muda para o Rio de Janeiro e passa por poucas e boas, num processo de carioquização involuntário. Novos episódios saem sempre às segundas e quintas-feiras.

Para acessar os episódios anteriores, vá ao ARQUIVO FANTÁSTICO, no canto direito superior do site, e escolha a data que você deseja. O primeiro capítulo saiu no dia 21 de janeiro. A partir daí, está na ordem cronológica, cada texto diz embaixo a data do próximo episódio. Acompanhe!

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