segunda-feira, fevereiro 02, 2004

02.02.04
Quase

Dia complicado. Quase que passava essa noite em Recife. Cheguei a fazer as malas e encaixotar os livros. Em dez minutos. Tudo graças àquela profissional.
Retorna das férias a senhora que faz a marcação das consultas. Como não me conhecia, me apresentei e simplifiquei o critério para encaixes: crianças com febre, diarréia, vomitando, com suspeita de pneumonia, gestantes com dor. Estava no quinto paciente quando me avisam que havia um telefonema para mim no orelhão público.
Identifica-se uma comunitária dizendo que havia estado no posto após passar dois dias internada em crise depressiva, com TPM e com o marido recém-falecido, encaminhada pelo hospital. Que eu havia me recusado atende-la. Que os outros médicos anteriores não eram assim. Que não dava pra esperar uma semana pra agendar consulta.
Disse ter falado com a moça da marcação de consultAS, QUE CONHECE HÁ TEMPOS , e antes que pudesse dizer “venha aqui”, desligou. Fui falar com a senhora. Não fora ela, mas a gerente, que sequer se justificou.
Retornei ao consultório, terminei de atender o paciente que estava atendendo e recolhi minhas coisas. Avisei aos pacientes que não ia atender mais ninguém, estava indo à Secretaria de Saúde comunicar o meu desligamento. Para ser maltratada eu preferia continuar em Pernambuco, lógico. Pelo menos estava em casa. Comuniquei à gerente e saí.
Cheguei, recolhi minhas roupas, livros, diante da esposa de papai, que pediu que eu me acalmasse antes de ir pra Secretaria. Era o que estava fazendo, ganhando tempo. A vontade era de pegar o primeiro ônibus, sem falar com papai, nem ninguém. Infelizmente, a gente vai ficando experiente e sabe que não pode ser assim. Fico satisfeita por não ter ficado na unidade discutindo, xingando. A equipe não vale que eu me descabele.
Fui à Secretaria me encontrar com a supervisora, APENAS POR CONSIDERAÇÃO à papai e a ela mesma, que muito boa gente. Na minha cabeça, o problema era comigo. Todo PSF em que trabalhei saí por incompatibilidade. Logo, eu era o problema.
Nos desencontramos e voltei pra casa andando (é impressionante a quantidade mínima de ônibus e a ausência de um táxi ou moto-taxi quando se precisa). Voltei à tarde, e papai sem saber de nada. Falei com a coordenadora, que não é da área, mas economista, e muito bem resolvida, graças a Deus. Tanto ela quanto a supervisora deram a entender, não muito sutilmente, que a gerente é um pé no saco, lerda e será substituída quando a unidade for reinaugurada. A essa altura a tal criatura e a paciente tinham falado com a supervisora, e a paciente foi clara em dizer que não havia sido minha culpa. Voltarei amanhã apenas para falar com ela. Apenas, porque agora NÃO ESTOU MAIS NAQUELA UNIDADE. Como o mundo é pequenino, vou ficar numa unidade que vi ontem, de passagem. Papai foi ver “a cheia” do rio e passamos diante da unidade de PSF mais bonita que já vi. Conheci por dentro hoje. São duas equipes, com uma recepção e uma sala pra arquivo, sala de prevenção de ca de colo uterino, sala pra acompanhamento de crescimento e desenvolvimento da criança, sala de pré-natal e saúde da mulher, dois consultórios médicos, sala de vacina, sala de curativo, sala de esterilização, sala de expurgo pro material dentário, sala de dentista, SALA DE REUNIÕES (pra fazer palestra!), copa, banheiro pros comunitários E banheiro pros funcionários, além de um quintal. Uma verdadeira mansão, recém-reformada.
O problema é apenas um. A família da supervisora, da coordenadora e a minha família estão na área de abrangência. Até a ex-empregada doméstica da casa de papai mora lá. É muita coincidência, ou não?
Mamãe sempre diz que quando Deus fecha uma porta abre uma porteira. Deve ser.
Rezem (mais) por mim. Amo vocês,
Agente “I-am-a-medical-doctor” Juliane X

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